As mulheres no cinema
Teste de Bechdel e #FilmHerStory
Vamos fazer uma brincadeira, juntos? Sim? Então, pega na minha mão e vem comigo:
– Primeiro, pense em um filme que tenha pelo menos duas mulheres.
Pensou? Essa é fácil, né?
– Agora, nesse filme que você escolheu, essas mulheres conversam uma com a outra?
Já ficou um pouco mais restrito, né? Aquele primeiro filme que você pensou não se aplicava? Pense em outro.
– Agora responda: Elas conversam sobre alguma coisa que não seja um homem?
Ihhhh, agora complicou, hein?
Pois é. Isso não era beeeem uma brincadeira. O nome desse desafio que você acabou de fazer é Teste de Bechdel e ele surgiu nos quadrinhos Dykes to Watch Out For [Lésbicas com quem você tem que tomar cuidado, em uma tradução bem livre], da cartunista norte-americana Alison Bechdel. As perguntas foram inspiradas na fala de uma amiga de Alison, Liz Wallace, e fazem referência a um trecho do ensaio “Um Teto Todo Seu” de Virginia Woolf, que já trazia o tema da superficialidade na representação feminina.
Originalmente, o teste estava na tirinha A regra, publicada, vejam vocês, em 1985. A peça era uma forma da artista de se manifestar contra a forma como as mulheres eram retratadas no cinema – e nas produções audiovisuais de maneira geral –, sempre em papeis coadjuvantes, superficiais e quase sempre vivendo em função de um drama que envolve um homem.
Bem, se eu ainda estou escrevendo esse texto aqui hoje, é porque o cenário ainda não é o ideal, não é mesmo? Faça o teste e aplique você mesmo as três perguntinhas de Bechdel a todos os filmes que você for assistir, você vai ver porque as mulheres ainda têm muito caminho pela frente quando o assunto é igualdade de representação e de direitos.
Isso não é um teste oficial com um nome legal, mas agora se faça mais uma pergunta: quantos filmes você viu que falam sobre mulheres importantes da história da humanidade? Cientistas, inventoras, ativistas, nomes que contribuíram para evolução do ser humano? E não venha me dizer que eles só não existem porque as mulheres não contribuíram!
Às vezes, a gente esquece que a história da humanidade contada nos livros ignora a participação feminina. E o cinema com frequência reflete isso. A campanha #FilmHerStory (Filme a História Dela) é uma iniciativa que nasceu justamente para criticar isso e propor uma mudança. Tudo começou em 2015 com o lançamento do trailer oficial de As Sufragistas, no mês da mulher, março.
Além de comemorar o lançamento do filme que conta a luta das inglesas que lutaram pelo direito do voto feminino, a campanha ajuda a lembrar que existem milhares de outras mulheres ainda não tiveram suas histórias contadas nem na literatura e nem no cinema.
É uma iniciativa que parte do público e que acompanha um movimento que vem acontecendo dentro da própria indústria cinematográfica.
Manifestações discretas das mulheres em eventos cinematográficos não são novidade. Contudo, nos últimos cinco anos parece que grandes nomes de Hollywood realmente cansaram do absurdo que é o gap salarial entre atrizes e atores, produtoras e produtores, diretoras e diretores, e daí por diante, entre tantas outras injustiças.
Embora não se declarem feministas, várias mulheres da história do cinema já colocaram a boca no trombone contra essa realidade. Quem não lembra e não se emociona com o discurso de Patricia Arquette? Vencedora do Oscar de melhor Atriz Coadjuvante em 2015, ela foi ovacionada por uma plateia ensandecida que incluía outra diva do cinema, Meryl Streep rainha suprema da categoria "não aguento mais essa palhaçada que é a desigualdade de direitos das mulheres no cinema".
O discurso de Patrícia era finalizado com a frase:
"A toda mulher que já deu à luz, toda cidadã que paga impostos, nós lutamos pelos direitos de todo mundo. É nossa vez de ter salários igualitários para todos e direitos iguais para as mulheres nos Estados Unidos"
Me arrepio só de lembrar! Veja o discurso na íntegra:
No mesmo ano, Viola Davis fez todo mundo chorar no Emmy, com seu emocionante discurso sobre mulheres negras e (falta de) oportunidades. Não vou nem fazer um recorte, porque esse merece ser visto por inteiro:
É claro, elas não foram as únicas. Emma Watson, com sua (polêmica) campanha He for She também vem chamando a atenção para a necessidade de prestarmos mais atenção sobre isso, bem como as mulheres que lançaram a hashtag #AskHerMore, rebelando-se contra a diferença no tratamento que se dá a mulheres e a homens nas entrevistas. Para as mulheres, se pergunta sobre os vestidos, sobre dicas de beleza e sobre como mantêm a forma física. Para os homens, se pergunta sobre carreira, planos, dificuldades para construir um personagem, etc.
Isso sem falar nos closes de cima a baixo no tapete vermelho, né Cate Blanchett?
Essa rebeldia das mulheres com um cinema dominado pelos homens vem se mostrando presente em todo o mundo. Aqui no Brasil, o desabafo da diretora Anna Muylaert, de Que Horas Ela Volta?, contra declarações machistas de amigos homens sobre seu trabalho também foi bastante discutido no ano passado.
Você conhece mais iniciativas nesse sentido?
Ah, e se você conhece algum filme que passe no Teste de Bechdel que traga mulheres em papeis mais consistentes, mande pra gente! Comente neste post ou mande um email para [email protected], pois estamos trabalhando em uma lista pra compartilhar aqui no Café com Filme!
Mães, filhas, rebeldes.
O filme brasileiro mais relevante de 2015!