Critica do filme Os Eternos | Nada é eterno, mas algumas coisas permanecem
Depois de mais de uma década e 23 filmes, é fácil esquecer as origens do MCU. Apesar da Fase 1 do MCU estabelecer as bases do “estilo Marvel”, o tom das produções se desenvolveu em um arpejo crescente até a sua conclusão da "Saga do Infinito" em Vingadores: Ultimato. Entretanto, tudo começou com Homem de Ferro, Incrível Hulk, Thor, Homem de Ferro 2 e Capitão América: O Primeiro Vingador, filmes com estilos relativamente distintos e pouco parecidos com o frenético Guerra Infinita e o grandioso Ultimato.
Os Eternos não é só o primeiro capítulo da história deste grupo de super-heróis cósmicos, mas também faz parte do prefácio da nova saga que emerge no MCU. Chloé Zhao apresenta uma “história de origem” que funciona em vários níveis utilizando uma narrativa inteligente que desvia da ação desenfreada e investe no desenvolvimento de personagens por meio de uma grande aula de filosofia digna do professor Chidi Anagonye (do seriado The Good Place).
Guerra Infinita e Ultimato são o cume da primeira grande Saga da Marvel nos cinemas, enquanto Eternos é o sopé de uma nova montanha que se agiganta à frente dos fãs. Pensando assim, a escalada ainda é longa, mas o escopo de Os Eternos, sugere que o topo é ainda mais alto. Mesmo com alguns deslizes, e com um estilo próprio que o desloca dentro do MCU, Os Eternos é um filme sólido que apresenta um novo e interessante início do universo Marvel nos cinemas.
Quanto tempo dura o eterno?
Sem entrar nos detalhes da cosmogonia Marvel, basta dizer que os Celestiais são os seres mais antigos e poderosos de todo o universo. Em 5000 A.C., o Celestial Arishem envia para a Terra um grupo de dez seres superpoderosos chamados de Eternos com a missão de proteger a humanidade de criaturas predatórias chamadas de Deviantes.
Sem poder interferir no desenvolvimento dos humanos, os Eternos seguem lutando contra os Deviantes até o dia em que estes estivessem totalmente erradicados e Arishem os convocasse de volta ao seu planeta natal. Milênios se passam e depois de várias “vidas” juntos o grupo começa a mostrar fissuras, questionando sua missão “divina”, a humanidade e seu papel não-intervencionista em um mundo que obviamente se beneficiaria de seus talentos.
Entretanto, com o reaparecimento dos Deviantes, os Eternos são forçados a se reunir e proteger a humanidade da antiga ameaça, apenas para descobrirem que muito mais está em jogo do que a erradicação dos Deviantes e o seu retorno para a casa. Sem revelar qualquer spoiler e entregar pontos importantes da trama, Chloé Zhao, Patrick Burleigh, Ryan Firpo e Matthew K. Firpo conseguem trabalhar com toda a grandiosidade da obra de Jack Kirby dentro do microcosmo de cada personagem.
A narrativa que aposta em flashbacks expositivos que contextualizam elementos do passado e presente, do relacionamento dos Eternos com os humanos e os Celestiais, o roteiro trabalha vários elementos em diferentes níveis a todo momento. A história é muito bem amarrada, ao ponto de mostrar que, de fato, não há um vilão na história.
Brilho Eterno
Gemma Chan, Richard Madden, Kumail Nanjiani, Lia McHugh, Brian Tyree Henry, Lauren Ridloff, Barry Keoghan, Don Lee, Kit Harington, Salma Hayek e Angelina Jolie. Misturando nomes em ascensão e estrelas já consagradas de Hollywood, o elenco de Eternos acerta em praticamente todos pontos.
Angelina Jolie, mesmo em seu “piloto automático” se destaca sempre que aparece em cena na pele de guerreira Thena, enquanto Don Lee esbanja carisma como Gilgamesh, o mais forte dos Eternos e guardião de Thena. Kumail Nanjiani cumpre seu papel de alívio cômico com naturalidade, deixando muito espaço para seus companheiros roubarem as risadas.
Vale destacar o esforço de Richard Madden, que mesmo limitado – algo evidenciado desde sua temporada em Game of Thrones – ainda entrega bons momentos e uma atuação sólida como Ikaris (o Super-Homem da Marvel) um personagem que precisa de muita flexibilidade emocional. Infelizmente o mesmo não pode ser dito de Gemma Chan, que oferece uma performance tão sutil que beira a monotonia, algo que não explora totalmente o arco de crescimento e superação de Sersi.
De eterno e belo há apenas o sonho
A lista de acertos de Chloé Zhao no roteiro ena direção também passa pelo seu uso inteligente da câmera que mescla efeitos práticos e poucas intervenções digitais. Mesmo com a renomada Industrial Light & Magic cuidado dos efeitos especiais, a diretora deixa o impacto visual emergir da construção da cena e não necessariamente do efeito em si, algo que confere ainda mais força para uma tradução mais fiel da identidade visual do rei Jack Kirby e a Era de Bronze das histórias em quadrinhos.
As cenas de luta, mesmo que espaçadas são bem coreografadas e utilizam as habilidades de cada um dos eternos, e certamente redefinem alguns conceitos dos “filmes de heróis”, especialmente na forma como representam os poderes de seres velocistas. Em outras palavras, chega de cenas em câmera lenta para mostrar que o personagem está se movendo mais rápido do que os outros.
Os Eternos não cobre toda cosmogonia Marvel, mas abre vários caminhos interessantes para o futuro do MCU.
Dentre muitos acertos e alguns erros, Eternos é sem dúvida um dos filmes de herói mais interessantes dos últimos anos. Vingadores: Ultimato finalizou um longo arco cuja memória inda é muito recente para o fãs. Com o “corpo ainda fresco”, essa Fase 4 do MCU precisará superar a expectativa do público para criar gradativamente a mesma grandiosidade que levou uma década para ser construída, para quem entende o contexto deste momento, Eternos se mostra como um ótimo ponto de partida.