Crítica do filme A Favorita

Até o amor tem limites...

por
Carlos Augusto Ferraro

17 de Janeiro de 2019
Fonte da imagem: Divulgação/20th Century Studios
Tema 🌞 🌚
Tempo 🕐 5 min

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Yorgos Lanthimos é um daqueles diretores ame ou odeie. Com uma filmografia curta, porém relevante, o diretor grego lança mão de metáforas fantásticas para deixar claro sua visão pessimista da humanidade e de como o mundo é cruel e perverso.

Com uma linguagem peculiar, Lanthimos já se estabelece como um dos nomes mais “interessantes” do cinema contemporâneo. Com uma cinematografia inventiva, histórias diferentes e muita habilidade na hora de extrair o máximo de seus atores, Yorgos Lanthimos chega maduro em A Favorita, entregando a sua obra mais “palatável” e coerente.

Deixando o fantástico um pouco de lado, o diretor tenta analisar a intimidade da corte britânica do início do século 18, mais precisamente do relacionamento da rainha Ana da Grã-Bretanha e suas fiéis conselheiras, as primas Sarah Churchill, Duquesa de Marlborough e Abigail Masham, Baronesa de Masham. Seguindo com seu alinhamento pessimista, o diretor explora como as três personagens jogam com sentimentos e poder para benefício próprio.

O resultado é um filme sólido, com um roteiro bem estruturado, atuações sensacionais, e uma direção refinada — na qual Yorgos presta algumas homenagens e mostra seu próprio talento —, fazem de A Favorita um grande acerto. Não é de se estranhar que o filme seja um dos mais mencionados ao longo da Award Season 2019 e, ao que tudo indica, um dos favoritos ao Oscar 2019.

Chafurdando na lama

Especulando sobre a história, os roteiristas Deborah Davis e Tony McNamara, propõem que o relacionamento da rainha Ana e Sarah, ia muito além de uma competente conselheira política. Em posição de destaque dentro da corte, a Duquesa de Marlborough não só controlava o acesso à sua majestade, como também controlava as próprias opiniões da rainha, através da sua hábil manipulação, seja sentimental, política ou sexual.

Eis que entra em cena Abigail, uma prima de Sarah cuja família caiu em desgraça. Destituída dos louros do passado, Abigail é uma garota de aparência frágil que apenas procura um lugar seguro; ou, pelo menos, é o que ela aparenta ser.

Seguindo uma trama bem familiar para os filmes de época, Rachel Weisz e Emma Stone travam uma batalha ácida em uma espécie de xadrez social pelo afeto da Rainha Ana (Olivia Colman). Insegura, frágil e notadamente bipolar, a rainha está no meio de duas guerras, uma interna e outra externa. As tensões políticas da corte britânica apontam para guerra contra a França, enquanto seu corpo padece lenta e dolorosamente a olhos vistos.

Em tempo descobrimos que, não há vilões e heróis, abusadores e vítimas. Como em todas as outras obras de seu catálogo, Yorgos deixa claro que a humanidade é cruel e perversa. Todos possuem interesses próprios, que podem ou não estar alinhados com os dos outros. 

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As favoritas

O trio Olivia Colman (rainha Ana), Emma Stone (Abigail Masham) e Rachel Weisz (Sarah Churchill) está sensacional. As três dividem o fardo de carregar uma história densa que pode facilmente ser lida como um drama político, em uma espécie de romance, com pitadas de comédia.

Apesar de caricata, Olivia Colman é a estrela do filme, sua transformação em Ana da Grã-Bretanha é excepcional, capaz de enternecer e causar desconforto. Operando no mesmo nível de excelência temos Emma Stone e Rachel Weisz. Contando histórias semelhantes, mas encapsuladas em suas personagens, as duas entregam atuações poderosas que incorporam todos os estágios da ascensão e queda das nobres damas da corte.

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Méritos aqui não apenas para as atrizes, mas também para os roteiristas e para Lanthimos, que conseguem extrair o máximo de cada cena, cada tomada.

Por sinal, a fotografia merece uma menção especial. Com muito estilo e habilidade, o diretor não tem medo de experimentar com lentes, enquadramentos e iluminação para explorar a cena visualmente das mais diferentes maneiras, conferindo um estilo “Barry Lyndon” a toda a obra.

O pessimismo é humor; o otimismo é vontade

A Favorita é um tour de force das três atrizes principais. Olivia Colman, por muito tempo subestimada, finalmente tem a chance de mostrar todo seu talento, enquanto Rachel Veisz entrega o melhor desempenho de sua carreira navengando entre momentos de pura maquiavelice e ternurat enquanto Stone prova seu valor e mostra que é capaz de dividir a tela com atrizes de alto calibre sem perder seu brilho.

Apesar de tratar de temas familiares, e de se fazer valer de um estilo muito próprio, A Favorita destoa um pouco da filmografia de Yorgos Lanthimos, que encontra aqui uma linguagem mais fácil para se comunicar com o grande público. Idolatrado por alguns e execrado por outros, Lanthimos parece ter refinado suas habilidade em nesse filme, resultando em um obra que tem sua marca indelével, mas se apresenta de maneira muito mais acessível aos seus críticos. 

A Favorita é como uma versão refinada de “Carlota Joaquina, Princesa do Brazil”. Ácido, engraçado e devastador...

Apesar da comparação incosequente, é possível sim estabelecer um paralelo satírico entre A Favorita e o filme nacional de Carla Camurati, Carlota Joaquina, Princesa do Brazil. Ambas as produções especulam ao redor de eventos e figuras históricas para satirizar os costumes e despir a nobreza. Joguetes políticos, escalada social, batalha de egos, tudo que acontece nos corredores escuros dos palácios é escancarado para quebrar a ilusão da perfeição absolutista.

Fonte das imagens: Divulgação/20th Century Studios

A Favorita (2018)

Nobres damas da corte...

Diretor: Yorgos Lanthimos
Duração: 119min
Estreia: 24 / jan / 2019