Crítica do filme A Luz no Fim do Mundo
Um Apocalipse para Refletir
Não é preciso ser um gênio para perceber que a cada dia que passa chegamos mais próximos do fim da humanidade como conhecemos e vivemos hoje. Em tempos em que a ganância de grandes corporações e a ignorância das pessoas têm combatido a ciência, podemos ter noção de como nossas ações podem resultar, eventualmente, em catástrofes globais ou em pandemias que podem dizimar toda uma população.
Esses são temas já comuns na indústria de Hollywood, mas muitos buscam exaltar mais o lado dos desastres, principalmente com incríveis efeitos visuais para impressionar a plateia com as tantas hipóteses de um eventual apocalipse. Todavia, vez ou outra, temos a chances de ver algumas ideias que saem do lugar-comum, sendo que “A Luz no Fim do Mundo” se encaixa justamente nessa categoria.
Em vez de partir de explicações sobre o passado ou tentar reproduzir o fim do mundo, o filme escrito, dirigido e protagonizado por Casey Affleck larga mão do tradicional para ir no lado mais reflexivo de situações extremas. Nesta história, acompanhamos um pai (Casei Affleck) e sua filha adolescente, Rag (Anna Pniowsky) buscando formas de sobreviver em um mundo devastado por uma pandemia.
E este poderia ser apenas um filme de ação com toques de sentimentalismo, mas o que vemos são indagações mais profundas, numa obra que acaba pendendo muito mais para um drama com pitadas de suspense. Assim, em vez de entregar absolutamente todas as respostas, “A Luz no Fim do Mundo” visa propor mais questões sobre como nos portaríamos quando temos que lutar pela sobrevivência de um filho.
O que fazer para passar o tempo quando o mundo está à beira de um colapso? Como manter a sanidade em um ambiente hostil? Quais sentimentos afloram para quem não tem nada a perder? E quais habilidades desenvolvemos quando temos tudo a perder? Essas podem parecer questões aleatórias, mas que são pertinentes se fossemos imaginar um cenário similar ao proposto nesta trama.
Ao que parece, Casey Affleck quis justamente colocar esses pequenos detalhes como o fundamento para o desenvolvimento do filme, algo que pode afastar o público mais tradicional já na primeira cena. O pontapé inicial é tudo que o espectador precisa para entender o cerne do filme, então se você não gosta de diálogos longos, pausados e sem trilha sonora, talvez você já pode ter noção que este não é o filme mais apropriado para você.
E esta poderia ser apenas uma cena perdida para dar suporte ao filme, porém, dado todos os argumentos introduzidos na trama e as situações de extrema cautela, o que temos é uma ampliação desse desenvolvimento pausado. O que é muito legal nessa abordagem é que a obra não entrega tudo de mão beijada, sendo que vamos compreendendo os detalhes do passado em pequenos detalhes e flashbacks.
Apesar do começo vagaroso e do ritmo lento (que parece ser ainda mais arrastado dado a duração total de duas horas de projeção), é válido ressaltar que isso não elimina o clímax do filme, tampouco impede a colocação de cenas mais tensas no meio da película. Muito pelo contrário, se você realmente prestar atenção aos detalhes, o filme consegue te captar pelas nuances do inesperado, afinal ficamos observando tudo nos cenários.
Longe de ser um apocalipse devastador, o caos proposto em “A Luz no Fim do Mundo” é muito mais “pé no chão”, o que ainda garante que o público fique curioso para entender os detalhes do que aconteceu, mas que evita que o filme tenha que inventar situações mirabolantes. Assim, o que temos são paisagens tomadas pelos efeitos do tempo e da natureza, que toma de volta o espaço.
A produção é caprichada nesse sentido, já que a composição visual e a fotografia são elementos cruciais para criar um ambiente mais convincente. Interessante também que com a história proposta, o filme consegue abordar diferentes cenários do fim do mundo, o que deixa a gente mais vislumbrado, bem como permite rumos inusitados na trama.
Falando nisso, crucial para o andamento da história são as atuações de Casey Affleck, que aqui continua sendo ele mesmo — numa pegada bem calma à la “Manchester à Beira Mar” — e da pequena Anna Pniowsky, que nos encanta a cada instante com sua personalidade fantástica. É claro que essa dinâmica entre os dois seria importantíssima, então o filme acerta em cheio ao ter dois artistas tão talentosos.
É claro que apesar de ter seu brilhantismo, os cinéfilos de plantão talvez associem muito do que há em “A Luz no Fim do Mundo” com o universo de “A Estrada”. Todavia, ao que me parece, as únicas coincidências são o fim do mundo e a relação paternal, pois do contrário são histórias e rumos bem distintos — cada um na sua pegada e com seus respectivos méritos.
No fim do dia, “A Luz no Fim do Mundo” é um ótimo filme para quem gosta de apreciar nosso lado mais humano, mas talvez não a melhor opção para os fanáticos por ficções sobre apocalipses. De qualquer forma, não duvido nada que o longa tenha algumas indicações nas principais premiações, pois é muito bem executado.
Não importa o quanto você cresça, sempre será minha pequena