Crítica do filme Aspirantes
Uma vida em jogo
No país do futebol, nem sempre é a paixão que move o time ou jogador. Às vezes o misto de sentimentos antes e depois de entrar em campo resulta em raiva, tristeza e inveja. Com a intenção de mostrar o contexto social que está presente no esporte, o filme “Aspirantes” de Ives Rosenfeld chega às telas de cinema para o público.
Sabe aquela história bonita de superação, que depois do jogador enfrentar diversas adversidades conquista a tão sonhada posição na equipe? Pois é, esqueça esta ideia. A história de Júnior (Ariclenes Barroso), atleta de um pequeno clube no interior do Rio de Janeiro, é outra.
Com pés no chão e bola rolando em campo, Ives Rosenfeld retrata as facetas da realidade de um menino que enxerga o futebol como a sua única saída da pobreza. Porém, o seu sonho fica cada vez mais distante ao saber que a sua namorada está grávida, sua relação com o padrasto não é das melhores e seu rendimento no treino não é o suficiente para se tornar um destaque.
Ninguém confia no potencial de Júnior, nem ele mesmo. Como tornar real o que é quase impossível? Dessa maneira, o diretor escolhe mostrar o ponto de vista de quem não está ganhando e, sim, perdendo. O ritmo do filme é lento, quase que arrastado. Mas, com uma única intenção: mostrar a jornada do anti-herói de Júnior.
Com poucos diálogos e pequenos pontos de viradas no decorrer da história, Aspirantes busca revelar nos pequenos detalhes as mudanças que ocorrem com protagonista. Sem árbitro no filme, o espectador é obrigado a treinar o olhar e usar toda a sua empatia para compreender o que está acontecendo com o atleta. Nem sempre os problemas são debatidos verbalmente.
O silêncio torna-se gritante no decorrer do longa. É tão incômodo e angustiante que sentimos a revolta, o medo e até o sentimento de inveja crescer no olhar e no sorriso de Júnior. A interpretação de Ariclenes Barroso recebe a difícil missão de carregar o filme até o desfecho final, que assim como uma partida de futebol, o tempo é inimigo de quem está perdendo. Até o mesmo do próprio longa.
A falta de velocidade na narrativa e pouco aprofundamento em pequenas histórias que são retratadas não auxiliam na construção do protagonista. Dessa forma, o filme transmite a sensação de ser um fato episódico que acontece na vida de Júnior sem uma conclusão, como se fosse uma partida de futebol que começa leve e esperançosa que caminha para o desespero e apita o árbitro. Fim.
Não é um filme sobre o sonho de ser jogador profissional, mas de quem precisa e enxergar o esporte como a única forma de ser alguém. Histórias bonitas ganham o coração de quem assiste, mas um pézinho na realidade revela algo muito maior no cinema: a vida. Próximo da veracidade social do futebol, Aspirantes conquistou os prêmios de melhor filme da crítica na 39 Mostra de Cinema em São Paulo e no Festival Luso Brasileiro de Santa Maria da Feira 2015