Critica do filme Atentado ao Hotel Taj Mahal
O exército dos justos
Em 26 de novembro de 2008, dez mujahidin do Lashkar-e-Taiba executaram 12 atentados em Bombaim, conhecida como capital financeira e maior cidade da Índia. O “11 de setembro” indiano, deixou mais de 190 mortos e cerca de 327 feridos. Dentre os locais dos ataques oito ocorreram no sul da cidade, sendo os mais relevantes o da estação ferroviária de Chhatrapati Shivaji Terminus (CST); o Leopold Café, um restaurante popular com turistas em Colaba; e dois hotéis cinco-estrelas, o Oberoi Trident, em Nariman Point, e o Taj Mahal Palace & Tower, próximo ao Portal da Índia. Um dos hotéis mais luxuosos do mundo, o Taj Mahal Palace ficou sob o domínio do medo por cerca de três dias.
A história é dramática, é assustadora, é real. Sem entrar em uma grande discussão ética sobre o valor de obras ficcionais que abordam temas tão sensíveis como ataques terroristas é fácil entender a origem da força narrativa por trás de Atentado ao Hotel Taj Mahal. Insensível ou não, a “hollywoodização” de tais eventos ajuda preservar a história, mantendo o relato vivo e aplacando eventuais revisionismos imbecis.
Sob o comando de Anthony Maras, em uma estreia surpreendente atrás das câmeras, o filme acompanha os eventos de uma maneira intensa e íntima, que faz com que cada tiro atravesse a tela e atinja o espectador diretamente. Dev Patel, Nazanin Boniadi, Jason Isaacs e Armie Hammer encabeçam um elenco forte que transpira toda a tensão e o medo do fatídico 26 de novembro.
Atentado ao Hotel Taj Mahal é um filme forte. Intenso na sua dramaticidade e na cinematografia, a obra de Maras — que também assina o roteiro ao lado de John Collee — é um dos melhores títulos desse subgenero de thriller hisstórico, assim como Munique e Voo United 93, caminhando sem grandes dificuldade sobre a fina linha ética do respeito às vítimas.
O roteiro de John Collee e Anthony Maras enfatiza os personagens em vez das ações. Assim, por mais imponente que seja a construção das cenas — e Maras realmente faz um trabalho soberbo com a câmera — o foco está sempre na humanidade. Por sinal, o roteiro faz questão de revelar algumas nuances dos terroristas, sem nunca permitir a total empatia por parte do público. O diretor nos apresenta aos monstros, mas deixa claro que esses são apenas emissários do mal. Servos descartáveis que são doutrinados e enviados para servir em uma guerra cínica.
Arjun (Dev Patel em ótima forma) é um garçom no Taj Mahal Palace Hotel — “onde o hóspede é Deus”, sob o comando do chefe de cozinha Hemant Oberoi (o lendário Anupam Kher de Doentes de Amor). Os convidados do dia incluem a herdeira muçulmana iraniana-britânica Zahra (Nazanin Boniadi, maravilhosa em todas as cenas) e seu marido americano, David (Armie Hammer, que agrade sem fazer muito esforço), com seu filho recém-nascido Cameron e sua babá Sally (Tilda Cobham-Hervey), bem como Vasili (Jason Isaacs no piloto automático), um o ex-agente Spetznaz (as forças especiais soviéticas).
No caos que se seguiu, Arjun, David, Zahra e Vasili ficam presos no restaurante do hotel com vários outros convidados, enquanto Sally, alheia a todo o alvoroço, permanece com Cameron em seu quarto de hotel. O filme empilha tensão cena em cima de cena, sem deixar espaço para alívios cômicos ou momentos de enternecimento.
A história básica é complementada por essas tramas secundárias, dando muito mais corpo ao filme, mesmo que apostando em narrativas clichê. A família separada, o altruísmo do herói, as armadilhas do egoismo e, especialmente, o “perfilamento racial” (racial profiling) — a perigosa mistura de generalizações e estereótipos que eclipsam qualquer observação objetiva.
Com muita habilidade, Maras e Collee navegam por essas subtramas entregando um filme coeso e surpreendentemente ágil. Méritos também da direção de Maras que confere fluidez ao movimento da câmera conforme atravessamos os corredores labirínticos do Taj Mahal Palace Hotel. Misturando cinema de ação com uma cinematografia documental, Nick Remy Matthews, Maras e Peter McNulty transformam o majestoso cenário do Taj Mahal em uma armadilha claustrofóbica.
Atentado ao Hotel Taj Mahal é um ótimo thriller histórico. Com muita ação e drama, o filme de Anthony Maras apresenta um momento triste da histórica contemporânea. Sem entrar nas motivações por trás da guerra, o filme — acertadamente — foca mais no meio (os atentados terroristas) do que na mensagem (a ideologia de certos grupos radicais islâmicos).
Atentado ao Hotel Taj Mahal é um ótimo filme, mas que pouco acrescenta ao diálogo dos motivos por trás dos eventos retratados
O elenco excepcional, liderado por Dev Patel e Nazanin Boniadi, oferece dramaticidade na medida certa, sem cair no dramalhão. A violência é uma presença constante, bem como o seu reflexo nos personagens. A tensão e o cansaço é visível e cresce conforme o filme se desenrola, passando uma ideia real da passagem do tempo.
Apesar de abrir as portas para um diálogo muito maior sobre as motivações dos ataques, Atentado ao Hotel Taj Mahal se preocupa apenas em mostrar as peças e o tabuleiro, omitindo-se da difícil tarefa de definir quem são os jogadores.
Bem vindo ao Taj Mahal Palace & Tower, desfrute da sua estadia