Crítica do filme Brooklyn – Sem Pai Nem Mãe
Empenhado, mas muito enrolado
Artistas versáteis são casos raros, mas versatilidade não necessariamente é sinônimo de efetividade. Começo essa crítica falando especificamente sobre isso, pois “Brooklyn – Sem Pai Nem Mãe” é um daqueles filmes que, além do nome esquisito, desperta nossa curiosidade por contar com um ator principal que é também o diretor e o protagonista da película.
Estamos falando aqui do icônico Edward Norton, que você certamente já conhece por seu trabalho em inúmeros títulos lá na década de 1990. Aliás, vale mencionar obras memoráveis como “Clube da Luta” e “A Outra História Americana”, que marcaram época tanto pelas temáticas quanto pela execução marcante, muito delas que levam mérito pelas interpretações pontuais do ator.
Agora, convenhamos que o Norton ficou meio fora do radar nos últimos anos (algo que aparentemente se deve pelo seu maior envolvimento em séries ou obras em que ele não é o protagonista). Além disso, é bom pontuar que “Brooklyn” é seu segundo filme como diretor e o primeiro que ele assina. Todavia, ao mesmo tempo em que ficamos curiosos com essa jogada arriscada, é inegável que a gente fica com um pé atrás, né?
A boa notícia é que, apesar de dar tiros para todos os lados, “Brooklyn – Sem Pai Nem Mãe” faz alguns acertos em cheio. Temos aqui um filme de suspense que puxa bem um estilo noir marcante, que faz boas mesclas de cenas de ação e, pasmem, até mesmo de comédia. O xis da questão é que toda a empolgação é facilmente ofuscada pelo ritmo vagaroso do filme.
Para quem ainda não viu a sinopse ou o trailer, vale uma introdução. Em “Brooklyn – Sem Pai Nem Mãe” acompanhamos Lionel Essrog (Norton) atuando como capanga de Frank Minna (Bruce Willis). Antes um mero ajudante, logo Essrog passa a seguir sua própria trilha como detetive particular para solucionar alguns mistérios, mas isso tendo que conviver com a síndrome de Tourette.
O problema é que além desta condição (que é caracterizado por tiques físicos e vocais), o protagonista apelidado de Brooklyn (daí o nome do filme) começa a lidar com criminosos que talvez sejam muito perigosos, o que deixa sua investigação ainda mais tortuosa. Longe de nos apresentar um herói, contudo, o filme não ganha nossa simpatia pela honestidade do personagem, mas muito mais por sua coragem.
É interessante que o filme traz um olhar de superação à condição do protagonista, mas também parece se apoiar muito na síndrome para fazer humor, o que é deveras péssimo. Honestamente, é difícil resolver isso, pois as situações criadas no roteiro forçam para esse caminho. Por outro lado, se não fosse um caso clínico, ter um detetive trapalhão seria curioso para os dias de hoje, em que não vemos mais personagens similares.
Também, se você ainda não viu este filme, pode ficar tranquilo que apesar do meu reforço sobre este tópico cômico, o longa está mais para um suspense do que para uma comédia escrachada. O ponto mesmo a ficar esclarecido é que temos aqui um raro exemplo de projeto cinematográfico que consegue abocanhar diversas facetas de forma inteligente, mas esse lado engraçado acaba ficando evidente diante do todo.
Apesar de começar de forma despretensiosa, o filme de Edward Norton logo toma proporções surreais e tenta abocanhar o mundo com os braços. Conforme comentei, é um filme que pende para vários gêneros e isso pode ser problemático. Ao começar a tecer uma teia muito grande de mistérios, “Brooklyn – Sem Pai Nem Mãe” vai para um caminho sem volta: o de não acabar nunca.
Para você entender melhor: lá pela metade do filme, o roteiro ainda introduz novos personagens e desenvolve coisas que, até de certa forma, são irrelevantes para o caso principal. É essas reviravoltas que acabam fazendo o projeto ficar muito longo e, por vezes, até cansativo. O roteiro de Norton até tenta driblar esse problema com cenas diversificadas e mais empolgantes, mas cada cena extra só aumenta o tempo total.
Contudo, não fosse essa indecisão de rumo e o cronômetro berrando que o filme nunca acaba, teríamos aqui um filme de suspense muito bem executado que enaltece o espírito noir de obras investigativas antigas e com uma pegada bem coerente à época da história. Os ambientes clássicos do Brooklyn, os clubes de jazz e o esquema político complexo é bem amarrado. E isso sem contar o ótimo elenco com famosos de peso (incluindo Bruce Willis, Willem Dafoe e Alec Baldwin) que dão um reforço para tornar o filme mais emocioante. Ótima tática até certo ponto, mas só essa carta não resolve todos os problemas.
Edward Norton se mostra exímio em seu papel, sendo convincente pela atuação geral e também pela questão da síndrome, mas considerando que ele escreveu e pensou em tudo sobre o personagem, era de se esperar uma boa representação). Todavia, mesmo com o tom de mistério, o roteiro não consegue evitar repetições na formulação e nas aparições do protagonista, o que resulta em situações cansativas e até irritantes.
Cheio de boa vontade e muito empenhado, Edward Norton se mostra um bom diretor, ainda um ótimo ator, mas um roteirista medíocre. Fica claro que ele tinha uma ideia central e tentou costurar tudo que dava até para fazer uma crítica política, mas o tiro sai pela culatra nesse script bagunçado e temos apenas um filme com potencial mal explorado. Boa pedida para quem curte suspense, mas esteja preparado para o chá de enrolação.
De bobo, só a cara