Crítica do filme Invasão Zumbi 2: Península
Ambição na contramão
O que acontece quando um filme faz muito sucesso e agrada tanto a crítica especializada quanto o público? Sim, isso mesmo, ele ganha uma sequência! É o caso de quase toda obra de terror e claro que não seria diferente no cinema oriental, que também é conhecido pelo uso dessas artimanhas, ainda mais com títulos que têm repercussão internacional.
Assim, quatro anos após a estreia de “Invasão Zumbi”, o diretor e roteirista Sang-ho Yeon, que encabeçou o primeiro filme, volta para a segunda dose e, novamente, como diretor e corroteirista (em ambos, ele dividiu a escrita com outros). E, considerando o brilhantismo do primeiro filme, nada pode dar muito errado, certo? Errado!
Se você acompanha um mínimo de cinema, talvez você tenha notado que há uma certa discrepância entre filmes originais e suas respectivas continuações. Então, antes de entrar em detalhes, eu já deixo a orientação: tire o pé do acelerador, porque o trem do hype quase sai dos trilhos nesta sequência.
Curiosamente, mesmo com tempo para polir roteiro e aspectos técnicos, bem como com muito mais dinheiro (uma vez que o primeiro longa-metragem deu um bom retorno), “Invasão Zumbi 2: Península” não consegue acompanhar a maestria de seu predecessor. Quer saber o porquê? Então, acompanhe os próximos parágrafos para saber se você deve se arriscar indo ao cinema.
Para você que desembarcou e ficou perdido na estação, vale a seguinte informação: a história de “Invasão Zumbi 2: Península” não tem relação direta com o primeiro filme. Então, você não precisa ver a obra de origem para entender este filme, bem como não adianta esperar personagens comuns, pois o filme joga o público em cenários totalmente distintos.
Justamente para desconectar os filmes e evitar possíveis tragédias, Sang-ho Yeon resolve separar as histórias com um bom intervalo de tempo: quatro anos (sim, o mesmo tempo que demorou para sair a continuação é exatamente o tempo que avança na história). Isso dá um bom respiro para evitar erros de roteiro e ainda garante infinitas possibilidades no caos zumbi.
Além disso, é importante enfatizar que parte da conexão entre os filmes parece ser puro marketing, pois os nomes originais não são bem diferentes. O primeiro é conhecido apenas como “Trem para Busan”, enquanto o segundo recebe o título de “Península”. Assim, o acréscimo de “Invasão Zumbi” é justamente para garantir o interesse da galera e indicar que se trata de uma continuação.
Eis um ponto relevante para ficar atento, uma vez que “Invasão Zumbi 2: Península” não parece uma continuação, mas uma expansão do universo apresentado no primeiro, o que são coisas completamente distintas. Esclarecido isso, vale falar um pouco sobre a história. Aqui, acompanhamos novos protagonistas, em situações muito mais caóticas.
Quatro anos após o surto de zumbis, a península coreana ficou devastada. E o roteiro tenta retratar isso ao levar o filme para um contexto internacional, com trechos de reportagens na televisão americana e até personagens ocidentais. Nesse ponto, não há como negar que a contextualização é importante, já que um caso desses jamais ficaria somente nas notícias locais da Coreia do Sul.
Paralelamente, somos levados a conhecer os protagonistas da história, mas com uma ênfase maior em Jung-seok, um ex-soldado que conseguiu fugir do país, após um episódio complicadíssimo – aliás, vale menção para as ótimas cenas de introdução, de altíssimo nível em execução e drama. Depois de ficar refugiado um tempo em Hong Kong, ele recebe uma missão de retornar à Coreia do Sul e lá, surpreendentemente, ele encontra alguns sobreviventes.
É nessa mistura de um apocalipse zumbi sem precedentes com personagens humanos à beira da loucura, que somos levados à “Península”. As sucessões de fatos são desdobramentos da trama principal, que poderiam levar a lições pertinentes ou cenas memoráveis, mas que acabam parecendo puro exibicionismo regado a clichês e dramas que não conseguem a comoção almejada.
Agora, momento charada: O que Vin Diesel e Invasão Zumbi 2 têm em comum? Resposta: ambos são Velozes e Furiosos! Eu realmente queria entender em que mundo o autor do primeiro filme achou que seria uma boa ideia fazer essa mistura de apocalipse zumbi com corridas absurdas em cenários inusitados, pois o filme parece ser muito inspirado na famosa franquia de carros.
E não é pouca coisa, viu? Algumas longas cenas parecem mais fases de videogame do que parte do contexto do filme. Eu até entendo a possibilidade de brincar com isso e usar até “Zumbilândia” como referência, afinal um mundo destruído dá esse tipo de abertura. Todavia, muitos minutos de filme são roubados nessas brincadeiras, que não agregam e beiram o tédio.
Há outros pontos que destoam muito do antecessor, como a ambientação, a trilha sonora e até mesmo os protagonistas. É claro que ao propor essa expansão da infestação zumbi, o filme precisou de novos cenários, mais amplos, tomados de carros jogados para todos os lados e da natureza tomando conta do ambiente urbano.
Com a ampla gama de filmes hollywoodianos que já retrataram isso inúmeras vezes, a tarefa de trazer inovação à telona é árdua. Todavia, o que cria uma sensação de familiaridade é o uso de cenas e músicas já conhecidas em outras mídias. Por exemplo: eu não pude deixar de relacionar cenas de “passeio” com trilhas embaladas por acordes de violão com o famoso jogo The Last of Us.
Quanto aos personagens, é claro que é impossível manter uma mesma pegada em filmes separados por quatro anos de roteiro, porém o que fez de “Invasão Zumbi” um sucesso foi o protagonismo. Lá, a inexperiência jogava em favor da emoção e do drama; aqui, há excesso de heroísmo, que muda não só o rumo do filme, bem como o gênero.
Parece uma americanização forçada na tentativa de cativar mais fãs ocidentais. E o pior: para os olhos mais atentos, fica muito evidente o uso descomedido de cenas em computação gráfica. E isso fica evidente pela baixa qualidade nos efeitos visuais. Talvez um recurso inevitável dado o tamanho do caos proposto, mas faltou esmero. Enfim, o tiro saiu pela culatra.
E olha, pelo tom do meu texto e com tantos argumentos apresentados, fica evidente que eu me decepcionei com o resultado final. Contudo, para ser justo, eu acho bom ponderar que “Invasão Zumbi 2: Península” ainda consegue honrar de certa forma seu predecessor ao nos mostrar compaixão e humanidade num mundo tomado por ganância e violência.
Já tava bom, diz que ia mudar ele pra melhor, aí tava ruim, agora parece que piorou...
Talvez esteja na hora do criador da obra repensar se vale insistir na franquia, pois um terceiro episódio pode ser arriscado se continuar nessa pegada. E fica a dica: se você gosta de zumbis e só quiser curtir um filme com pipoca, é provável que “Invasão Zumbi 2” divirta e passe longe do tédio (o que é bom), mas não espere a mesma emoção, ok? É o famoso: veja por sua conta e risco.
O destino é pior do que a viagem...