Crítica do filme Invencível
Quando viver é sinônimo de resistência!
Se nós, meros apreciadores, concordamos com a complexidade do processo de criação cinematográfica e ainda assim somos rigorosos com o produto que nos é apresentado, o que passa pela cabeça de alguém com a trajetória tão significativa como a de Angelina Jolie? Dela esperamos o extraordinário dentro e fora das telonas.
Por tudo que sabemos sobre ela, além do profissionalismo, é que criamos imensa expectativa em torno de seu trabalho como diretora. Na Terra de Amor e Ódio (2011) foi sua primeira experiência, denunciando violações praticadas pelos sérvios na Guerra da Iugoslávia no início da década de 90, tornando ainda mais evidente o seu interesse pela causa dos direitos humanos.
Nem todo mundo gostou do que viu, afinal, o conflito ainda é recente e custam a cicatrizar as feridas de um confronto tão sangrento e desproporcional. E é bem por isso que sua estreia tem valor, com a ousadia de quem tem a acrescentar dando visibilidade aos povos que são tratados como invisíveis.
No próximo dia 15 estreia o segundo filme sob sua direção. Mantendo o olhar sobre a guerra, mas com o objetivo de contar a vida inspiradora do atleta olímpico que se tornou soldado e sobreviveu como prisioneiro nos campos de concentração japoneses.
Foi um privilégio poder conferir e deixo a seguir as minhas impressões sobre esta que, sem dúvidas, será uma das mais premiadas produções de 2015.
Escolher Jack O'Connell como protagonista de Invencível foi uma missão criteriosa, levando em consideração as características marcantes do veterano Louis Zamperini descritas no livro de Laura Hillenbrand, sobre o qual a película se baseia.
Segundo Jolie, era importante que o ator selecionado tivesse o apoio da plateia. De fato, identificar-se com ele é fácil, por se tratar de um soldado que lutou com os Aliados no contexto da Segunda Guerra Mundial. Entretanto, o típico patriotismo estadunidense é deixado de lado quando acompanhamos a infância de Louis.
As primeiras cenas mostram a origem do homem que investiu toda sua dedicação para se tornar um atleta olímpico, num esforço acima do normal e enfrentando a discriminação por pertencer a uma família italiana. Desde criança tendo que conviver com os insultos e levando surras frequentes, conseguiu resistir à angústia graças ao incentivo de seu irmão mais velho.
Chegando ao pódio, aquele que era considerado estrangeiro se converte no símbolo da nação. É seguindo essa lógica de superação que Louis observa o afro-americano Jesse Owens desafiando a ideologia nazista na abertura dos Jogos Olímpicos de Berlim em 1936. Ambos no estádio onde foram vitoriosos fazendo o racismo comer poeira na pista de atletismo, num primeiro contato com o conflito que teria início anos mais tarde e que transformaria adversários em inimigos.
A noção de pertencimento para Louis supera o sentimento proposto pela farda que lhe deram: sua presença é fundamental para a sobrevivência do grupo em combate aéreo e mesmo após a queda do avião.
Saindo um pouco da observação do personagem, chamo a atenção para as cenas de combate. São fantásticas as simulações das estratégias de bombardeios, os contra-ataques dos aviões japoneses e as explosões geradas por sistemas antiaéreos. A experiência na telona somada à qualidade de som da sala de cinema trará satisfação para os amantes de filmes de ação.
São sequências longas, mas muito gostosas de acompanhar. E se até então a plateia não se identifica com Louis, é a partir do instante da queda no oceano que inevitavelmente torcemos para que ele e seus companheiros sobrevivam.
Três soldados dividem o pequeno espaço no bote por mais de um mês e tais cenas conseguem nos fazer imaginar a situação com todo sofrimento enfrentado por Louis. Contudo sem nos castigar na poltrona do cinema: a transição entre as cenas é bem caprichada, assim como o detalhado trabalho de maquiagem que simula com perfeição os sintomas de desidratação dos sobreviventes.
E que baita instante de dor Louis suportou nas mãos dos soldados japoneses, em especial do seu maior algoz em toda a trama: o oficial Mutsuhiro Watanabe. O ator escolhido para vilão foi Miyavi, que, segundo Jolie, é alguém que representaria o aspecto paradoxalmente humano de um torturador.
De fato, os detalhes na sua forma de se expressar dão uma dinâmica confusa para o personagem. Quando seus olhos se perdem durante alguns diálogos, o oficial transparece o medo por trás de uma postura tão hostil.
Tão duradouro é o sofrimento de Louis, estendendo também o tempo do filme para um pouco mais de duas horas, mas a sensação é prazerosa com o efeito catártico ao perceber no horizonte a chegada das tropas resgate. Um milagre ao qua devemos acreditar, conforme sugere a ótima trilha sonora da banda Coldplay.
Finais felizes são quase sempre imbuídos de uma superficialidade típica, mas esta é uma rara exceção.
Sobrevivência. Persistência. Redenção.