Crítica do filme IT 2
Um Espetáculo de Terror!
Adaptações de livros para filmes são complicadas, mas muitos dos projetos baseados nas obras de Stephen King já mostraram que há como obter sucesso sem cair em clichês — e isso vale até mesmo para remakes de um mesmo conto. A prova máxima são as duas versões de “IT - A Coisa”, que já teve versão para televisão e ganhou, mais recentemente, uma segunda chance através de uma superprodução para as telonas, a qual agradou gregos (os críticos) e troianos (o público em geral).
Nem parece, mas faz dois anos que tivemos o prazer de conhecer este novo olhar de IT, algo proporcionado tanto pela visão de novos profissionais quanto pelos efeitos visuais atuais que permitem transcender a simplicidade da versão antiga — o que na época tinha que ser compensado muito pela atuação. Bom, desde o fatídico dia da estreia da nova versão, nós já sabíamos que era só uma questão de tempo até a segunda parte da história ganhar forma e, de fato, chegar às telonas para apreciarmos.
Pois bem, o dia chegou, mas, com razão, muitos fãs podem ter dúvidas se a “IT: Capítulo 2” consegue dar continuidade de forma coerente ao antecessor, ousa em apresentar novidades — ainda mais no comparativo com “IT - Uma Obra do Medo” —, agrega mais ao universo cinematográfico de Pennywise e, por fim, consegue evitar os clichês e seguir numa linha de ineditismo. As perguntas são muitas e nem todas as respostas podem ser dadas, mas vou ser o mais sincero e abrangente sobre todos os tópicos.
Para quem caiu de paraquedas aqui e não sabia da existência desta segunda parte, vamos a uma breve sinopse. Depois de 27 anos dos acontecimentos de “IT - A Coisa”, o Clube dos Otários retorna a Derry, à pedido de Mike Hanlon, para destruir de uma vez por todas a criatura Pennywise, que está fazendo novas vítimas na cidade. Traumatizados pelas experiências do passado e também pelos rumos de suas vidas, eles devem dominar seus medos mais profundos e enfrentar o palhaço, que está ainda mais perigoso.
Respondendo as dúvidas de quem quer evitar todo e qualquer detalhamento sobre o filme (ainda que não tenha spoilers por aqui), eu acho que vale já mencionar logo de cara que “IT 2” consegue entregar a qualidade de terror e uma trama com minúcias que todos esperávamos. Temos aqui um filme que segue uma trilha similar à de “IT - Uma Obra do Medo” (no sentido de ter atos muito similares), mas que inova por ir além e fazer bonito num final que realmente fecha com chave de ouro.
Ok, já sabemos que Pennywise é escabroso e que ele tem seus meios para aterrorizar suas vítimas, porém no primeiro filme nós estávamos lidando com protagonistas em uma fase bem inocente, o que facilitava bastante as coisas para o script. Já em “IT: Capítulo Dois”, o roteirista Gary Dauberman tem a difícil tarefa de lidar com personagens maduros (que já podem estar mais preparados para lidar com situações de medo) e de ainda — se não superar em questões de desenvolvimento —, ao menos, inovar no desenrolar da trama, já que estamos falando de um remake.
Outro desafio era a questão da atualização em “IT: Capítulo 2”. Enquanto o longa-metragem de 1990 não precisava lidar com tecnologias, esta nova versão tem a missão de manter a tensão ao mesmo tempo em que dribla alguns mecanismos inovadores. E é algo natural da plateia indagar porque os personagens não usam celulares, não chamam a polícia, não usam armas ou não apelam para outros tantos recursos que podem facilitar o combate ao vilão.
A dúvida que fica é: afinal, o que é necessário para criar um remake? Apenas refazer de uma forma levemente diferente é suficiente? Alongar uma história já muito detalhada pode criar essa sensação de satisfação para um público exigente? Bom, a aposta de Dauberman é sim espichar ao máximo o conto, mas ele não faz isso sem propósito. Assim, se você ainda não tinha visto na ficha do filme, saber que o filme tem quase três horas de duração pode ser um choque, porém tudo passa muito rápido e o filme é recompensador!
Bom, justamente por mostrar os integrantes do Clube dos Otários num futuro distante, há muito o que contar, ainda mais que eles estão em situações totalmente diferentes. Toda a parte de reunião dos personagens leva um certo tempo, mas o texto de Dauberman faz isso de forma inteligente, ao mesclar cenas dos protagonistas e situações da cidade de Derry. Isso ajuda a reconstruir a memória dos protagonistas (ainda mais para quem viu o filme há dois anos) e vai ampliando a sensação de horror ao trazer cenas inventivas com Pennywise.
É nessa mescla de diferentes personagens, ocasiões e também tempos que o “IT 2” cria uma composição muito inteligente. Aos poucos, nossos protagonistas são devidamente reapresentados e aí temos uma brilhante solução de aproveitar cenas inéditas do passado para criar uma história ainda mais rica em detalhes — o que é simplesmente maravilhoso para os fãs da obra. Então, eis aqui o primeiro ponto importante para você que ainda não viu: esteja preparado para um verdadeiro LONGA-metragem e ainda mais preparado para uma overdose de terror.
O desenrolar dos fatos era provavelmente o aspecto mais importante para este novo capítulo conquistar o público, contudo é evidente que uma direção impecável e um elenco competente fossem o suporte para essa história ganhar vida com ousadia. Bom, o diretor Andy Muschietti retorna aqui e faz um trabalho caprichado, que puxa várias ideias que já vimos na primeira parte — uma vez que temos alguns cenários repetidos —, porém que se apresenta ainda mais ousado em algumas sequências.
Alguns teasers que a Warner liberou previamente já dão algumas pistas, em que vemos Pennywise atuando mais, assustando em situações críticas e se escondendo nos lugares improváveis. É justamente por essas novas ideias que “IT: Capítulo Dois” supera seu antecessor e este se mostra um trunfo importantíssimo para convencer a plateia, afinal temos o mesmo vilão, então ele precisava ser mais imponente para nos impressionar e causar impacto em suas vítimas.
A trupe em sua nova composição tem nomes como James McAvoy, Jessica Chastain, Isaiah Mustafa, Bill Hader, James Ransone, Jay Ryan e Andy Bean. Alguns desses já são bem conhecidos do público e é evidente que um dos destaques fica para McAvoy que interpreta Bill Denbrough (que já era o principal no primeiro filme). A escolha do ator para o papel foi bem ponderada, uma vez que ele usa de toda sua versatilidade — que já vimos em “Fragmentado” — para dar vida ao personagem que retorna com seus momentos de medo e de reflexão sobre tudo que aconteceu.
É válido puxar outro tópico aqui: a diversidade dos personagens. Isso é muito bem introduzido por vários deles, mas é Beverly Marsh, revivida por Jessica Chastain, que nos faz ter uma dimensão do qual trágico é o circo da vida. O roteiro de “IT: Capítulo Dois” traz questões atuais sobre a única personagem feminina, incluindo as dificuldades de sua vida pessoal antes de chegar em Derry, bem como sua importância na trama por ter muita relevância no primeiro título. A atriz é uma das que mais tem tempo em tela, mas isso não é problema algum para Chastain, que é versátil em todos os seus diálogos. Ok, alguns clichês, mas todos muito justificados.
Os demais atores também têm seus respectivos méritos e o filme faz questão de separar um bom tanto de cenas para cada um, motivo pelo qual o filme ficou tão longo. Felizmente, todos esses pequenos trechos somados não apenas trazem o que já havíamos visto em “IT - Uma Obra do Medo”, mas são aproveitados para mostrar muita coisa nova, incluindo novas áreas da cidade e algumas explicações bem interessantes que enriquecem a mitologia de Pennywise.
Por fim e talvez algo ainda mais importante do que tudo que já foi mencionado, vale enaltecer a performance insana de Bill Skarsgård. Se no primeiro capítulo tínhamos um palhaço mais tímido (também por conta do script), agora temos inúmeras cenas em que o personagem é muito bem desenvolvido, o que resulta em mais tempo de tela para o ator. Sim, as cenas com computação gráfica ainda predominam, mas há uma participação muito maior do ator, que capricha em seus olhares sinistros e até mesmo na interpretação ímpar, que nos deixa cara a cara com o palhaço em seu estado mais íntimo e terrível.
É claro, o resultado amedrontador de “IT 2” se dá pela somatório de todos esses aspectos, mas se amplia pela adição de uma fotografia genial e ainda a maestria de uma trilha sonora que mescla nostalgia, horror e cantorias desgraçadamente bizarras. E, no fim, a gente tem não apenas uma ótima continuação e desfeche para “IT - A Coisa”, como também um longa-metragem que pode ser considerado — se não o melhor — um dos melhores títulos de terror do ano! Uma experiência incrível no cinema e para marcar época!
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