Crítica do filme Me Chame Pelo Seu Nome

O amor é igual para todo mundo

por
Thiago Moura

23 de Janeiro de 2018
Fonte da imagem: Divulgação/Sony Pictures
Tema 🌞 🌚
Tempo 🕐 7 min

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Mais uma história de amor, só que levemente diferente. “Me Chame Pelo Seu Nome” é um filme de drama de 2017 dirigido por Luca Guadagnino e escrito por James Ivory, baseado na obra homônima de André Aciman. O cenário é algum lugar ao norte da Itália, no ano de 1983. Essa imprecisão é proposital, a justificativa lúdica para que qualquer pessoa que queira passar férias de verão em um lugar paradisíaco possa estar na pele dos protagonistas, nem que seja por um breve momento.

Nesse local e breve espaço de tempo conhecido como férias de verão em família, Elio Perlman (Timiothée Chalamet) é um adolescente de 17 anos que está entediado por passar mais um verão ali, contando as horas para que acabe. Seu pai (Michael Stuhlbarg) é um pesquisador  americano de história e cultura clássicas, especialmente obras do período helenístico.

Para ajudá-lo com as pesquisas ele recebe ajudantes durante o verão e o escolhido da vez é o americano Oliver (Armie Hammer), de 24 anos. Ao contrário dos ajudantes anteriores, Oliver desperta a curiosidade e afeição de Elio, o que após uma longa jornada de descobrimento culmina em um romance entre os dois.

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Elio é um músico talentoso, passando seu tempo entre transcrever Schoenberg, compor variações ao piano de obras de Bach e devorar todo tipo de literatura. Toda essa cultura fervilha na família Perlman, todos são proficientes em inglês, francês, italiano e até alemão, no caso da elegante mãe de Elio, Annella (Amira Casar).

Além disso, eles são judeus, mas “judeus discretos”, como Elio descreve ao visitante Oliver, que não por acaso carrega uma Estrela de Davi no pescoço. Todos esses detalhes são revelados aos poucos, conectando os personagens e revelando mais camadas de cada um, ainda que Oliver permaneça envolto em mistério.

“Me Chame pelo Seu Nome” promete agradar aos cinéfilos por diversas razões. Por se passar na década de 80, a legião de nostálgicos contemporâneos vão sair extremamente satisfeitos da sessão, com toda a moda e formas de se divertir que não envolvem uma tela sendo lindamente representadas. E não digo isso de forma pejorativa, é tudo realmente esteticamente lindo. Indo mais além, a nostalgia aqui é voltada a algo marcante que aconteceu e está sendo recontada de forma romantizada, como se as lembranças de Elio estivessem sendo projetadas para o espectador.

No livro tudo é narrado a partir do ponto de vista do nosso jovem protagonista, então talvez seja essa a forma sutil que o diretor Luca Guadagnino escolheu para contar o romance.

E por mais clichê que tudo isso possa parecer, o longa conta a história de um garoto crescendo, aprendendo o que quer, descobrindo sentimentos e sensações novas, em um momento que a homossexualidade não era tão natural quanto nos dias de hoje. Além disso, não é uma história padrão no sentido em que não há um grande vilão, ou um grande problema, como por exemplo uma família conservadora. Ao contrário, tudo flui muito naturalmente ainda que de forma intensa e rápida, como todo amor de verão.

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Dessa maneira, se é necessário encontrar um conflito dentro dessa história, o tempo é o único vilão possível. A inevitável separação, quando o verão acabar e Oliver retornar ao seu país. Essa indagação é narrada por Elio, ao questionar-se “por que não aproveitamos todo esse tempo?”. Essa relação entre o tempo e a memória ficam explícitos em apenas uma cena, que parece deslocado do restante do filme.

Elio está perdido em seus pensamentos, tentando entender se Oliver sente o mesmo que ele, tudo isso muito antes de acontecer qualquer situação amorosa entre eles. A projeção parece estar com problemas e a película se soltar do projetor, enquanto a música composta por Sufjan Stevens canta “Is it Video?” (isso é um vídeo?). É estranho, quase questionando a própria natureza da narrativa, se era só imaginação ou uma memória confusa desvanecendo.

Por sinal, a trilha sonora é marcada por um piano repetitivo, uma música toca diversas vezes ao longo do filme e depois de algum tempo pode incomodar os ouvidos destreinados, mas no geral é tudo muito bem pensando. O longa é marcado por um jogo de sedução constante. Quase todas as ações dos dois rapazes são para demonstrar sutilmente seus sentimentos, e a cena sempre é composta visando deixar um dos dois em um ponto de vista mais privilegiado que o outro. Além dos diversos planos sequência magistralmente executados, a câmera mantém movimentos constantes que convidam o público a participar da relação entre os dois, indo do foco nos personagens para um objeto qualquer em cena, como se fosse a direção natural do olhar de alguém presente naquele mesmo cenário.

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É claro que o filme toca em questões delicadas. Pra começar, nenhuma cena é muito explícita, ou pelo menos nada que seja chocante para os cidadãos de bem. É um típico filme europeu, onde a nudez é naturalizada e não apelativa. Os mais atentos vão notar que existe uma diferença de idade entre o casal, sendo que Elio tem apenas 17 anos.

Na Itália, a idade de consentimento é 14 anos e em nenhum momento a relação dos dois é marcada por nenhum tipo de abuso, é tudo consentido. E finalmente, o filme mostra Elio crescendo, se descobrindo e vivendo um grande amor, mas durante esse tempo ele vive um breve relacionamento com sua amiga Marzia (Esther Garrel), então muitos dirão que na verdade Elio é Bi, e não Homo. Apesar de discordar dessa problematização, cada um é livre para interpretar como quiser, e nada disso diminui todos os méritos dessa obra.

Por mais simples que possa parecer a premissa do filme, atuações medíocres estragariam totalmente a experiência, algo que felizmente não aconteceu. Armie Hammer está excelente no papel do misterioso Oliver, principalmente com a química praticamente palpável entre ele e Elio.

Mas o grande destaque é Timothée Chalamet, que entrega uma atuação excelente, sendo visível a mudança no olhar do garoto inocente se transformando em algo cada vez mais sedutor. A dedicação de Chalamet foi tanta que ele aprendeu a tocar violão e a falar italiano para esse papel, além de tocar piano de três estilos diferentes em um plano sequência excelente.

Só que duas cenas merecem destaque: a controversa cena do pêssego (que prefiro esquecer) e a cena final. Talvez o maior vilão seja mesmo o tempo, pois o último ato se estende tanto que a cada corte a sensação de que poderia ter acabado ali mesmo aumenta. Porém a recompensa vem com a cena final, em que novamente Chalamet doa o seu melhor, encerrando com o sentimento preciso daquele momento e transpondo tudo isso na tela.

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“Me Chame Pelo Seu Nome” tem um estilo diferente, mais calmo, como férias de verão onde a preguiça e os momentos de diversão são os mais valorizados e lembrados. E no meio disso tudo, a descoberta de um primeiro grande amor, em que duas pessoas que se gostam demonstram esse sentimento sem medo, se entregando ao seus desejos de forma honesta e pura, sabendo que o tempo vai estragar aquilo tudo, mas a memória vai guardar o que foi bom.

Fonte das imagens: Divulgação/Sony Pictures

Me Chame pelo seu Nome

Uma dolorosa elegia para a paixão

Diretor: Luca Guadagnino
Duração: 132 min
Estreia: 18 / jan / 2018
Thiago Moura

Curto as parada massa.