Crítica do filme Negócio das Arábias
Tudo acontece, Babaganuche
O trailer de “Negócio das Arábias” – e também o título do filme – pode ter deixado você um tanto encucado com o rumo que essa história poderia tomar no cinema.
As poucas dicas do vídeo apenas nos informam que Alan Clay (Tom Hanks), um homem de negócios, foi para a Arábia Saudita na tentativa de arrumar sua vida financeira.
Acontece que, ao acompanhar a história mais de perto, percebemos que o roteiro vai muito além dessas questões. Na cidade de Jeddah, longe da realidade dos Estados Unidos, ele realiza várias tentativas para conseguir dinheiro, provar para sua filha que ele é um homem capaz e, talvez, realizar algo surpreendente em sua vida.
Só que o mundo neste mar de areia pode ser mais doido do que Clay imagina para uma viagem de negócios. Ele se depara com pessoas muito diferentes, bem como com ambições e peculiaridades que não imaginava. “Negócio das Arábias” é assim, um filme de pluralidade com roteiro inesperado e diversão pontual que mostra formas distintas de encarar a vida.
O roteiro de “Negócio das Arábias” é bastante simples. A ideia vem do livro “Um Holograma para o Rei”, que trata justamente do tal negócio que o protagonista vai fazer com um dos líderes da região lá nas Arábias. A tradução do título para o português faz bastante sentido, uma vez que o nome do livro talvez ficasse um pouco confuso na divulgação do filme.
Acontece que entre o argumento básico e a execução do longa-metragem há um mar de coisas. Alan Clay vai para o Oriente Médio com um objetivo bem simples. Todavia, conforme você pode ver no trailer, o rei não é uma pessoa muito acessível. A forma como isso é apresentado dá a entender que as coisas funcionam de uma maneira bem alternativa por lá.
Pessoas desinformadas, problemas de comunicação, limitações no ambiente de trabalho, areia, falta de recursos, lugares enormes, vestimentas, mais areia, calor absurdo, proibição de bebidas alcóolicas, costumes, locais públicos para execuções e areia que não acaba mais. Tudo isso contribui para deixar Clay um pouco irritado, cansado e desorientado neste mundão. As piadas, o ritmo do filme e a trilha, por outro lado, mostram que nem tudo é o fim do mundo.
Enfim, com as tantas dificuldades para encontrar o rei, o executivo de vendas resolve aproveitar o tempo vago para explorar o deserto. Ele conta com a ajuda de Yousef (Alexander Black) para fazer esse tour pelas arábias. O ator coadjuvante — ainda um novato em longa-metragens — interpreta um árabe bem engraçado e se mostra bem versátil para contracenar com Tom Hanks. As falas de um completam a do outro, o que garante dinamismo na trama.
A presença de outros personagens como a doutora Zahra (Sarita Choudhury, que você talvez conheça de “Jogos Vorazes” ou da série “Homeland”) e da colega Hanne (Sidse Babett Knudsen) ajudam a diversificar a trama. O protagonista vai da areia à balada, da balada ao consultório médico, do consultório a um edifício em construção. É uma verdadeira salada-mista, mas as piadas pontuais acabam deixando o passeio pelas Arábias bem divertido.
Tão importante quanto a trama principal é a construção de uma segunda temática dentro do filme. Apesar de mostrar um protagonista bastante exausto por conta dos problemas da vida pessoal, que não parecem ser facilmente resolvidos com a viagem para as Arábias, o longa faz questão de desenvolver algumas ideias em segundo plano que acabam sendo bem válidas e pouco comuns.
Tom Hanks mostra novamente seu talento, sendo o cara isolado no meio de um universo peculiar, que apresenta temas que podem deixar a plateia relutante
O roteiro aproveita vários cenários para desconstruir a visão que muitos têm do Oriente Médio. Com o foco nas grandezas da região, nos monumentos, nas peculiaridades do povo e em vários costumes que destoam do que acontece no Ocidente, o filme consegue passar uma visão muito otimista, sem deixar de pautar algumas regras e práticas um tanto questionáveis.
Alguns temas latentes centralizam nas limitações impostas às mulheres, que são submissas e sofrem muito diante de leis tão rígidas. São características incabíveis para muitos espectadores, ainda mais em sociedades como a nossa que tentam justamente obter a igualdade de direitos. A história ainda aborda outros problemas que são tapados com a peneira, como a questão da mão de obra filipina.
A escolha de Tom Hanks para explorar esse mundo foi um passo na direção certa. O ator mostra novamente sua competência em levar um filme todo nas costas, sendo o cara isolado no meio de um universo bem peculiar. A bagunça para fazer o personagem passar por tantas situações bizarras talvez foi um pouco desnecessária, mas no fim, com o talento de Hanks, o título surpreende.
Apesar de deixar a plateia um tanto relutante sobre a cultura distinta, a obra de Tom Tykwer (“A Viagem” e “Sense 8”) é mais um convite do que uma crítica ao diferente. Com o exemplo de Alan Clay, o longa-metragem “Negócio das Arábias” mostra que é sempre importante correr atrás da felicidade, seja viajando, tentando novamente, aproveitando as pequenas coisas. Isso sim é o verdadeiro negócio, seja nas Arábias ou em qualquer lugar do mundo.
Confira o trailer deste filme dirigido por Tom Tykwer