Crítica do filme Onde Está Segunda?

Uma resposta obviamente egoísta

por
Fábio Jordan

18 de Setembro de 2017
Fonte da imagem: Divulgação/Netflix
Tema 🌞 🌚
Tempo 🕐 6 min

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É inevitável. Todas as previsões apontam que os humanos vão conseguir acabar com o mundo que conhecemos num piscar de olhos. Não importa qual seja o plano mirabolante que inventem, pois a ganância de alguns vai se sobrepujar aos direitos de tantos outros.

Você já viu essa mesma história em vários filmes, livros, séries, jogos, gibis. Nos reproduzimos em progressão exponencial, o que resulta num consumo de recursos imensurável. E o planeta Terra não está pronto para dar tal suporte. Moral da história: vai dar ruim.

E como resolver? Bom, a China já adotou uma medida funcional: o controle populacional. Este é o argumento básico para o desenvolvimento de “Onde Está Segunda?”, que mostra um futuro não muito distante, em que o governo usa esta tática para, supostamente, dar condições de uma vida minimamente satisfatória para os humanos que habitam o planeta e para a próxima geração.

Assim, os casais podem ter apenas um filho. Qualquer criança a nascer posteriormente deve passar por um processo de criogenia, com a possibilidade de despertar numa época com maior abastância de recursos. Neste cenário, Karen Settman é agraciada com sete filhas gêmeas, mas não sobrevive ao parto. O avó das crianças então cria uma tática para elas sobreviverem neste regime controlado.

O plano é simples: cada uma recebe o nome de acordo com os dias da semana e só pode sair de casa naquele dia específico, porém todas elas são a mesma pessoa. Num belo dia, após muitos anos com o plano funcionando perfeitamente, uma das irmãs desaparece sem deixar vestígios. Agora, as seis irmãs – sem ter a quem recorrer – farão de tudo para solucionar esse mistério. Elas só tem um pequeno problema: o governo.

Isso é tão Black Mirror a lo pobre

A ambientação de “Onde Está Segunda?” é familiar. Já vimos cenários com sistemas rigorosos em outras produções como “Equilibrium” ou “Minority Report”, então nada de extraordinário nesse ponto. Sim, há um excelente trabalho de design de cenários, que garante uma apresentação de um mundo convincente, mas não espere nada surpreendente como um “Blade Runner”.

As limitações de orçamento parecem impactar nas tecnologias apresentadas, então nada do que é mostrado deve surpreender os mais aficionados. Os sistemas visuais são genéricos e as poucas inovações para interação com os personagens deixam o andamento da carruagem muito por conta dos diálogos e situações das personagens principais. Assim, o desenvolvimento não é tão viajado.

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E depois de alguns minutos neste mundo superpopuloso e controlado, é impossível que a gente não faça a conexão e solte um “isso é tão Black Mirror”. Contudo, assim como na série que surpreendeu uma galera com alguns roteiros supostamente criativos, não há nada de muito inédito do ponto de vista tecnológico neste longa-metragem. Tudo é coerente, porém o filme não tenta ser incrível neste aspecto.

Notáveis mesmo são as incoerências tecnológicas. Num mundo em que o governo mantém controle absoluto da população, o roteiro falhar em premissas básicas – como um método mais rigoroso para o controle populacional – é simplesmente patético. Daí para frente, tudo só tende a piorar, pois já estamos anos-luz à frente do GPS tradicional e de técnicas de vigilância.

“Ah, Fábio, mas isso é só um filme”. Pois é, mas é um filme que tenta empurrar uma história com base em tecnologia, então o mínimo que os roteiristas precisam fazer é entregar coerência e dar argumentos para os espectadores acreditarem que aquilo é real, ainda mais numa época em que estamos tão conectados e conhecemos minimamente as capacidades da rede mundial.

A emenda saiu pior do que o soneto

Apesar da pegada de ação impressionante em boa parte do longa-metragem, me parece que falta ousadia do diretor em alguns momentos. A execução é satisfatória para a proposta geral, mas sabe quando você pensa “putz, podia ter uma câmera lateral aqui, mostrando melhor essa cena de perseguição?”. Pois é, talvez só eu penso nisso, porém fica aqui meu pitaco de que dava pra fazer diferente e possivelmente melhor – na verdade, sempre dá, né?

O roteiro por outro lado esbanja nos exageros, tanto que fica até forçado e a gente fica descrente, já que as personagens não são agentes secretas ou soldadas com habilidades incríveis. Sim, é claro que existe licença poética, mas eu sou sempre de argumentar quanto à preguiça notável dos escritores, que muitas vezes não fazem questão de caprichar e deixar a história devidamente amarrada.

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Apesar dos pesares, há grandes méritos ao elenco. O destaque fica para Noomi Rapace, que se desdobra em sete para interpretar as gêmeas em diferentes situações. Falando assim parece simples, mas só de pensar em tantas identidades visuais com diálogos distintos, trejeitos exclusivos e interações próprias para cada papel, dá para ter uma ideia do trabalho árduo da atriz.

A participação de Willem Dafoe e Glenn Close também agregam valor à obra, sendo que ambos dão fôlego à protagonista ao balancear o roteiro com cenas explicativas, que deixam o ritmo mais lento em alguns pontos. Aliás, importante notar que a trama segue um rumo bem diferente daquele que se pode ter a impressão pelo trailer. Particularmente, eu esperava um filme menos agitado e mais tenso.

No fim, falta criatividade no desenvolvimento e sustância para uma história mais coerente, o que dá argumento para questionarmos a consistência dessa ficção. Todavia, o tema ainda é muito importante e novas visões são sempre válidas. Ainda que não seja perfeito, “Onde Está Segunda?” é um bom filme do Netflix e leva nossa recomendação.

Fonte das imagens: Divulgação/Netflix

Onde Está Segunda?

Sete irmãs, uma identidade

Diretor: Tommy Wirkola
Duração: 123 min
Estreia: 18 / ago / 2017