Crítica do filme Virgens Acorrentadas
Não levem muito a sério…
No melhor estilo Grotesc-O-Vision (mostra de cinema de horror realizada em Curitiba), Virgens Acorrentadas celebra os filmes de terror em vez de simplesmente categorizá-los como prazeres culposos. O diretor Paulo Biscaia Filho, responsável por pérolas como Nervo Craniano Zero e Morgue Story: Sangue, Baiacu e Quadrinhos, usa Virgens Acorrentadas para gritar que não há culpa nenhuma, e que nós amamos esses filmes horríveis, ou melhor, nós amamos cinema.
Apostando na metalinguagem, o roteiro de Gary McClain Gannaway mostra um grupo de amigos que decide fazer um filme de horror na raça e na coragem. Construindo sua história pouco a pouco, o grupo chega naturalmente a um desfecho sanguinolento. Realidade e ficção não se misturam, pois são indistinguíveis; o espectador nunca sabe ao certo de que lado da câmera ele está. Paulo Biscaia Filho e Gary McClain Gannaway brincam com o gênero, referenciam clássicos e prestam homenagens aos predecessores (especialmente Herschell Gordon Lewis, um dos favoritos de Gannaway).
Virgens Acorrentadas não é só um filme de terror B com tripas, sangue e mutilações falsas, mas também é um filme sobre como fazer um filme de terror B: com muitas tripas, litros de sangue e várias mutilações. Quem não gosta, gosta, quem gosta, curte! Como o próprio diretor do filme falou antes da cabine de imprensa realizada em Curitiba, no dia 31 de julho, “não levem muito a sério”.
Virgens Acorrentadas é um grande elogio ao cinema, mais especificamente aos filmes de terror B. Com uma história que explora todo o processo de realização de uma película, da criação do roteiro (ou apostando na narrativa emergente), dos perrengues financeiros e até a escolha do elenco (com contenção de gastos), Paulo Biscaia e Gary Gannaway mostram que cinema é arte, cinema é técnica, mas acima de tudo, cinema é amor.
Homenageando títulos que marcaram o gênero splatter, a dupla se mostra incrivelmente comedida no uso de sangue e entranhas ao longo do filme, até chegarmos ao catártico terceiro ato. Por sinal, a maquiagem é um ponto forte da produção, levando-se em conta que a estética é naturalmente “grotesca”. Não estamos falando de efeitos à la Rob Bottin (Enigma de Outro Mundo), mas sim de algo asqueroso, mais na linha Tom Savini (O Maníaco) ou Marjory Hamlin (Fome Animal).
Com tomadas que fazem jus ao nome splatter (respingo), Biscaia evoca toda a demência de clássicos como Massacre da Serra Elétrica (Tobe Hopper) do próprio O Mágico Sanguinário (Herschell Gordon Lewis). Os fãs vão se deleitar com corpos decapitados, torsos dilacerados e uma sorte de ferimentos inusitados que só poderiam sair de mentes criativamente doentias, dignas dos mitológicos filmes snuff.
Como Paulo Biscaia confirmou, Virgens Acorrentadas é inspirado em uma história real! Um roteirista cansado de ter seus trabalhos recusados resolve arregaçar as mangas e tocar o projeto adiante por conta própria. Essa é a história do filme e essa é a história de Gannaway e tantos outros cineastas espalhados pelo mundo.
Para fazer Virgens Acorrentadas, Gannaway organizou um financiamento coletivo online para bancar parte da produção —, enquanto isso os personagens do filme lutam para conseguir a grana e bancar a produção. Dentro e fora do filme temos o desenrolar da narrativa emergente, da construção do roteiro, da escalação do elenco, da ajuda dos amigos... Não é ficção é a realidade daqueles que adoram fazer cinema.
Problemas de orçamento, falta de apoio, bloqueios criativos…
O verdadeiro terror é fazer cinema!
Com uma carreira sólida, no teatro e no cinema, Paulo Biscaia cria o Grand Guignol contemporâneo, misturando a tradições teatrais com quadrinhos e referências pop. Fundador da produtora Vigor Mortis, em 1997, o cineasta paranaense sabe muito bem como é essa vida de quem ama contar histórias e, portanto, traduz esse sentimento com muita propriedade em Virgens Acorrentadas.
Não é o tipo de filme que você está pensando...