Crítica do filme Até o Fim
Um mar sufocante de desventuras!
Eu queria muito ter visto o filme “Até o Fim” no cinema, mas a falta de tempo e de sessões me impediram. Felizmente, o Netflix é uma caixinha de surpresas e não é por acaso que mantenho minha assinatura.
É comum rodar o catálogo do serviço e não encontrar nada, mas, de vez em quando, a gente acha um ou outro filme que acabou de sair do cinema e já está ali, antes mesmo de chegar aos canais de TV por assinatura. Sorte minha.
“Até o Fim” (que no original é “All is Lost” ou “Tudo está Perdido”) é um longa-metragem independente escrito e dirigido por J.C. Chandor — cineasta pouco conhecido do qual você dificilmente deve ter ouvido falar.
Participante do Festival de Cannes 2013 e ganhador de alguns prêmios em outros eventos, este longa-metragem conta a história de um homem que luta contra as forças do destino e da natureza em uma situação inusitada: um naufrágio em alto-mar.
Estrelado por ninguém menos que Robert Redford (que fez um zilhão de séries e filmes na década de 1960, “O Grande Gatsby” lá na década de 1970 e outros tantos conhecidos), esta obra cinematográfica surpreende de diversas formas. Vamos entrar nos detalhes da coisa.
Durante uma viagem pelo Oceano Índico, o protagonista sem nome (Redford) acorda e se depara com uma inundação em seu barco, algo que ocorreu depois que um contêiner à deriva atingiu a embarcação. Com sua experiência de navegação, o homem consegue remediar o problema, mas as coisas vão de mal a pior.
No decorrer do filme, acompanhamos uma série de complicações (tempestades, falta de comida e até mesmo o desespero causado por todo o ocorrido) que vão colocar o marinheiro frente a frente com a morte. Todas essas situações são detalhadas e são elas que compõem a história, portanto não espere grandes reviravoltas, pois o script não vai muito além disso.
Justamente por não ter muitos personagens e cenários, o roteiro de “Até o Fim” pode ser detalhista, o que deixa o filme muito interessante. Quase todas as ações do protagonista são acompanhadas de perto, garantindo que o público acompanhe o desenrolar da história sem que seja necessário o marinheiro dar informações verbalmente sobre suas atitudes.
Isso deixa o filme bem direto, evitando que a atuação fique tosca ou que seja preciso falas em segundo plano para explicar o que está acontecendo. Pode até acontecer de que uma ou outra ação demore a ser compreendida, mas tudo é explicado (com câmeras bem posicionadas) sem que o personagem precise ficar falando sozinho.
Aliás, falando em atuação, é de ficar abismado como Redford é capaz de ser tão convincente. O currículo dele já diz muito, mas, aqui vemos que mesmo em seus quase 80 anos, o ator prova novamente que sabe ser dramático e encarar papéis árduos, sendo capaz de se comunicar apenas com expressões faciais e gestos precisos.
A verdade é que “Até o Fim” é desastre e tensão do começo ao fim. Se você é do tipo que tem medo de nadar no mar e que jamais enfrentaria o oceano nem mesmo em um navio de cruzeiro, então o filme pode ser pânico do começo ao fim. Muitas cenas são sufocantes e mesmo quando você pensa que tudo está bem, o filme pode colocá-lo debaixo da água em poucos segundos.
Cada rangido do barco, cada onda que bate no casco e até mesmo os sons dos trovões são apavorantes. A sonoridade é peça-chave aqui e funciona perfeitamente. O clima só tende a piorar e o espectador não escapa da fúria da natureza. Logo, você faz parte do naufrágio e sentirá o drama deste navegador que mesmo sabendo o que fazer não tem chances perante o imenso oceano.
Todo o jogo de câmeras mostrando o panorama da situação debaixo da água e acima de tudo ajudam a dar uma noção do tamanho do problema (e a fotografia mesmo sendo repetitiva consegue ser belíssima). Felizmente, no meio de tanto sufoco, há um ou outro lampejo de esperança, garantindo uma pequena pausa para que você possa respirar e encarar a próxima adversidade.
Conforme eu disse, o filme não tem falas, então quase todo o drama é retratado com o silêncio do personagem. Aqui, os sons ambientes e a trilha sonora é que fazem o papel da comunicação. As músicas do estreante Alexander Ebert usam recursos que são capazes de dar a entonação perfeita tanto para os momentos de desespero quanto para os mais tranquilos. Um trabalho de qualidade e emocionante!
Emocionante, instigante e, acima de tudo, angustiante, “Até o Fim” é capaz de prender a atenção do espectador, colocando-o em meio a tempestade junto ao protagonista. Se você gostou de “As Aventuras de Pi”, vale dar atenção especial a esse filme, que não tem o tigre, mas que pode deixá-lo ainda mais apreensivo. Temos aqui mais uma prova de que os filmes independentes podem surpreender.